Crianças
são presentes do Universo
Adultos
espancam e torturam crianças até a morte.
Pais matam filhos.
O que está acontecendo com a humanidade?
*
Por Roberta Araujo
O
Ministério da Saúde divulgou na semana passada
que, a cada dez horas, uma criança é assassinada
no país. Além dessa trágica informação,
triste é saber que a maioria dos homicídios
acontece dentro de casa, local onde as crianças deveriam
esperar por proteção, segurança, amor,
carinho e respeito. Às vezes, as tragédias
acontecem a partir do intuito de querer educar as crianças
dando-lhes uma surra. O psiquiatra Içami Tiba tem
razão, quando diz que “quem perde o controle
não pode educar. A educação é
um projeto racional”.
Recentemente, dois episódios deixaram o país
em choque. Um deles é o caso da menina de 12 anos
que foi torturada pela empresária Silvia Calabresi,
em Goiânia. Embora não tenha havido homicídio,
imaginar que alguém pode manter uma criança
algemada, amordaçada e cometer inúmeras crueldades
é estarrecedor. O outro caso é o da Isabella
de Oliveira Nardoni, de 5 anos, que foi espancada e jogada
do 6º andar (segundo peritos, ainda viva) de um prédio,
em São Paulo. O pai de Isabella, Alexandre Nardoni,
e a madrasta Anna Carolina Jatobá são os principais
suspeitos até agora.
Em
2007, a forma como o menino João Hélio Fernandes
Vieites, aos 6 anos, foi morto também causou pavor
à população. Preso ao cinto de segurança
do carro de sua mãe que acabara de ser assaltado,
o menino morreu após ser arrastado pelas ruas de
vários bairros cariocas. Nem a agonia do garoto fez
os assaltantes parar o veículo.
Os números de violência infantil são
alarmantes. Mas a agressão doméstica ainda
é a que mais eleva o índice de mortalidade
entre as crianças. Em todo o Brasil, especialistas
tentam explicar os possíveis motivos que levam pais
a matar seus filhos. Um deles já chegou a afirmar
que o estresse - provocado pelo desemprego, divórcio,
doenças e outros problemas pessoais – pode
ser um dos fatores determinantes para desencadear nos adultos
uma certa agressividade, capaz até de matar seus
rebentos.
Cada profissional fará sua análise a respeito,
de acordo com suas experiências profissionais ou de
vida. No entanto, creio que o cerne do problema está
na perda do sentido de humanidade, na perda da noção
do que é sagrado e na perda dos laços familiares.
Olho as pessoas e percebo que a maioria segue em direção
ao abismo. Não há esperança no olhar,
não há compaixão, não há
um objetivo maior que as dêem coragem para ultrapassar
as barreiras naturais da vida.
É inaceitável uma mãe matar um filho
porque não tem dinheiro para criá-lo, porque
não tem apoio do marido ou de quem quer que seja.
As crianças são sagradas. Elas têm o
dom natural de despertar nos adultos o amor incondicional,
àquele que não precisa de nada que venha de
fora para desabrochar. Ao dar valor a esse amor e ao sagrado
que compõem a vida de uma criança, o Universo
inteiro age para corresponder os anseios dos pais. A vida
do Universo está contida na vida de cada ser humano
e vice-versa. Se alguém faz esforço para compreender
e aceitar esse amor, esse sagrado, sem dúvida, essa
pessoa não terá problema algum para criar
uma criança.
De acordo com um dicionário famoso, a expressão
humanidade sintetiza o conjunto de seres humanos capazes
de compartilhar compreensão, benevolência,
amor e solidariedade. Mas ninguém está preocupado
com isso. As pessoas estão mais preocupadas, por
exemplo, com a riqueza alheia, se a mulher do vizinho trai
o marido, com as modernidades, com as manchetes dos jornais,
com as promoções num shopping center, com
o desenrolar de um reality show.
É lamentável que muitos vivam sem perceber,
sem enxergar que há uma lei da causalidade presente
em todas as formas de vida. Quando digo causalidade, quero
dizer sobre a lei da causa e do efeito. Se cometemos erros,
não há um inferno para julgar. O inferno é
aqui, nesta vida, neste planeta, de onde virá o efeito
para causa que cometemos nos pensamentos, nas ações,
nas palavras. É preciso abrir os olhos para essa
lei. É preciso vencer os próprios fantasmas,
é preciso superar a maldade inerente na mente humana.
Não somos seres humanos vivendo uma experiência
espiritual, somos seres espirituais vivendo uma experiência
humana. Cada criança que surge traz em si a capacidade
de ensinar aos adultos a melhor forma de viver, sobretudo
para os que já perderam a alegria, a imaginação,
o sorriso despretensioso.
Através do olhar das crianças, posso ver um
futuro melhor, onde haja amor e respeito ao próximo.
Através do contato com uma criança, consigo
crer que a paz mundial existe, consigo crer que pode haver
um mundo sem fome, guerra, desigualdade social. As crianças
não cegam a gente para essas realidades, elas apenas
nos mostram como olhar para tudo isso sem o pessimismo,
sem o peso do rancor. Crianças são presentes
do Universo.
Roberta
Araújo é jornalista |